Breve tratado sobre o herói, por Rodrigo Emílio.
Grazas aos amigos de http://ofogodavontade.wordpress.com , recuperamos este "tesouro" do noso Rodrígo Emílio. Adiantamos que, no vindeiro nº de TIERRA Y PUEBLO publicara-se a traducción ao castelán.
A vía heroica non é unha quimera ou simples entelequia intelectual. A Vía do Herói, explicada polo deus Krishna ao guerreiro Arjuna, é a "revolución silenciosa", sútil e invisíbel, da que nos falou F.Nietzsche ou J.Evola . É a transmutación interior e realización do Eu superior, que logo ten que reflectir no exterior. Nestes tempos onde impera o Caos sobre a Orde, onde hai mais Tebras que Luz, sirva pois este precioso texto como breve pero intensa meditación, como exortación à procura e revelación do herói que leva cada un de nós no seu interior.
O herói é o arquétipo da consciência mitológica do Homem; o acto heróico, uma excursão do Homem ao absoluto de si mesmo; o heroísmo, a memória de Deus no Homem. Todo aquele que, de algum modo, faz juz à dignidade suprema de ser tido e havido à conta de herói, está em condições humanamente ideais de evidenciar as potencialidades divinas (ou paradivinas), mediúnicas e demiúrgicas, do ser humano. Com isto, quero eu dizer, cá na minha, que só na qualidade de herói é que a criatura reduz um pouco a distância que a separa do Criador. O mesmo é dizer que, somente em face do herói, terá Deus boas razões para se orgulhar da criatura, razões de peso para se rever nela: pois só o herói – só ele, afinal – dá a Deus ( e aos mortais) a certeza de ter sido o Homem uma criação concebida, e espiritualmente materializada, à imagem e semelhança da grandeza do Criador.
Muitos são os campos da afirmação heróica; muitos e às vezes simultaneos, às vezes concorrentes. É o caso do herói que congraça a coragem e a sabedoria, elevando-se a um plano de vitoriosa supremacia sobre a mediania humana: «numa mão sempre a espada, noutra a pena», «braço às armas feito, mente às musas dada», Luís de Camões é aqui chamado.
Entre as mais altas espiritualizações do heroísmo, é de incluir os santos e mártires da Fé, entendidos como sendo os heróis de Deus; e, logo depois, o herói de condição guerreira – de preferência habitado pelo espírito de cruzada: trabalhado pela ascese cristã; animado e accionado por essa voltagem mística, que dá sentido pleno a todos os ideais vitalistas.
A nível supremo, o herói configura, assim, o modelo do homem idealmente perfeito, que consegue reunir em si um difícil equilíbrio de virtudes, ou toda uma gama de desmesuras coroadas pela religião.
É apanágio do herói transcendentalizar-se, isto é, humanificar, ou humanizar, a transcendência divina, com a imanência do próprio valor, e consumar, por aí, uma personalidade de excepção, que a façanha (ou proeza) heróica autentificará.
Quanto ao heroísmo, não será propriamente um estado (ou sê-lo-á, quanto muito, de maneira latente e latejante). As mais das vezes, consigna um momento, esporádico, um lampejo, fulgurante, de transcensão e ultrapassagem, consagrando, desse modo, todo um código de acendrada determinação e de superadora estoicidade.
Concretamente. Herói é todo aquele que no tempo se levanta para a Eternidade. Quando o tempo vem cobrar o quinhão de anos que lhe adiantou no nascimento, chega tarde. Porque, a essas horas, já o herói conquistou no tempo a intemporalidade, a poder de cometimentos que, não raro, se chancelam numa eternidade de segundos.
Ora, no tempo decaído em que vivemos, está bem de ver que o sucedâneo do heroísmo é o vedetismo (no cinema, no teatro, no desporto, etc…) Acresce que as teorias filosóficas do absurdismo – rendendo laudas à imotivação e à ausência de finalidade da existência – põem desde logo em causa a validade humana do herói. Serve-se frio. «Serve-se morto» – diz-nos Reinaldo Ferreira em «Receita para fazer um Herói.» Porque heróis, só por receita. Lá para esses abstrusos «do absurdo», só assim se confeccionam heróis; por meio de receita aviada. De contrário, revelam-se inobtíveis, visto que a fauna existencialista não produz disso. E nem admira que não: figurantes de trazer na botoeira da existência, exibe-os a vida na lapela. Compreende-se: na lapela. Quando muito, aí…que a mariquice mental não entende além desses janotismos!
Rodrigo Emílio, n’O DEBATE de 1 de Dezembro de 1973
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